A CIDADE DAS MALHAS
Manhã de quinta-feira. Acordo para mais um dia de pedal. Desta vez serão 61 km até Imbituva. Desço, monto a bicicleta e já sou saudado por um rapaz que viu a entrevista na TV. Tomo café, agradeço à Cintia, que me ligou despedindo-se e tiro a magrela da garagem. Ueba, aqui vamos nós. Subo a rua poupando as pernas, que subida logo de cara assim costuma machucar… paro na farmácia e compro um protetor FPS 50 (R$ 35,00… um roubo, senti-me lesado) e na quitanda para comprar bananas e mixiricas. Pronto, agora é só cair na estrada.
Esta estava longe e o caminho tinha uns trechos meio complicados. Um caminhão faz questão de meter a mão na buzina, como quem diz “sai daí, nanico”. Faço o sinal internacional de OK, que neste país significa outra coisa, e detenho-me para fazer uma derradeira foto do skyline da “Princesa dos Campos”, que tão bem me recebeu.
Por fim chego à PR-153. O sol aberto é prenúncio de jornada quente. Pedalo cerca de 7 km e recebo uma chamada do Marcelo, o repórter da TV Educativa que me entrevistou ontem, dizendo que o carro de reportagem da TV Vila Velha, retransmissora da TV Bandeirantes, irá se encontrar comigo logo à frente, no posto da Polícia Rodoviária.
De fato, após cerca de 10 km vejo pelo retrovisor um carro atrás de mim, no acostamento, com o pisca-alerta ligado. Aciono o freio mas vejo a câmera para fora e mudo de idéia. Sei que já estão gravando e então sigo pedalando. Eles me ultrapassam e param mais à frente. Alcanço-os e passo direto, imagino que é essa a imagem que o cinegrafista quer. Quando vejo pelo espelho que ele depôs a máquina, faço meia-volta e retorno para conversar. A repórter, chamada Asmi, é rápida e o motorista me pergunta: para onde você está indo agora?
– Para Imbituva.
– Por aqui? Você tinha de ter pego o desvio, 100m atrás. Bem que estranhei…
Cáspita. Por um triz não pedalei quilômetros e quilômetros em vão na direção errada… para depois ter de voltar quilômetros e quilômetros para pegar o caminho correto. De carro é chato, mas de bicicleta dá desespero… Enfim, ficou no quase. Eles se foram, eu retornei, peguei a estrada certa, passei defronte a Polícia Rodoviária, cumprimentei todo mundo e segui adiante. Logo parava à sombra de um ponto de ônibus para almoçar. No cardápio, o de sempre.
Mas o sol , ao meio-dia, estava castigando muito. Senti que mesmo com o protetor a pele dos meus braços queimava. Mas quem mais sofre são as coxas. A pele da parte de cima de minhas coxas tem alergia ao sol extremo e faz manchas vermelhas. Paciência, quem quer conforto fica em casa. Concluo minha refeição e reparto. Faltam 27 km, segundo a placa.
Num dado trecho, interrompe-se o acostamento à direita. Sou obrigado a ir pelo acostamento da pista oposta e ao aproximar-me de uma curva à esquerda lembro-me de uma advertência feita pelo Fabrício, ao saírmos de Jaguariaíva. Ele disse:
– Numa situaçlão dessas, é comum os caminhões invadirem o acostamento, cortando faixa. E se você não está atento, acaba dando de frente com um desses…
Eis, pois, ciclista amigo, uma situação de risco típica a ser conhecida. Nestas circunstâncias, pedale o mais à esquerda que puder. E fique esperto!
Voltando à mão correta, ouço um apito altíssimo atrás à direita e vejo que é um trem anunciando sua presença, pois logo adiante há uma passagem de nível sem cancela. Ele está bem ao meu lado, um tanto mais alto e o maquinista ao passar por mim acena. Fico pensando… até maquinistas… isso jamais teria acontecido se eu estivesse pilotando uma motocicleta. Adoro trens e fico admirado com o comprimento desse. Ele simplesmente não vai parar nunca mais de passar… É imenso.
Num determinado ponto sinto que tenho de parar e, de preferência, esparramar-me no mato à beira da estrada. É o que faço… uau, quase ouço minhas costas dizerem “que delícia”, mas no mato há insetos – estão em toda parte, são a maior biomassa do planeta – e sou obrigado a interromper meu sagrado descanso após escasso 1 minuto ou coisa parecida. Ainda assim saio dali injuriado por duas picaduras (picaduras, eu disse, tudo junto).
No mais tudo transcorre sem novidades e chego ao trevo de entrada de Imbituva, a “Cidade das Malhas”.
Logo ao passar sob o pórtico de boas-vindas há uma placa: “Hotel Estrela – 5 km”. E por uma estrada com péssimo asfaltamento sigo vendo madeireiras à beira do caminho, até que começa “a rampa”.
Para chegar até o centro de Imbituva, há um aclive interminável, que deve ser vencido porque não há opção. Estou cansado. O sol castigou demais… Se até aqui vim bem, os quilômetros finais começam a tornar-se torturantes.
Passam os 5 quilômetros e nada de hotel. A rampa acentua-se, desço e empurro até o topo do morro. E enfim chego ao Estrela, que ficava consideráveis 2 kms além dos 5 anunciados.
Faço a ficha na recepção, desmonto, guardo e tranco a bicicleta. Subo para o quarto. O hotel é simples e fez um desconto ao projeto Rodas Livres. Jogo todas as roupas sujas no lavatório e entrego-me à tarefa de esfregá-las, enquanto o corpo esfria. Quando concluo, saio do banheiro e eis que alguém tenta entrar no quarto. Se a porta não tivesse trancada ter-me-ia encontrado como vim ao mundo, um pouco mais suado, talvez. Fico um tanto excitado imaginando se teria sido alguma camareira atraente, mas esses pensamentos são apenas fruto de uma carência natural de quem sai por aí deixando tudo para trás.
Então penduro as peças lavadas, tomo uma ducha morna, ponho minha roupa “de sair” e vou perambular pela cidade. É rampa prá todo lado, o que fica mais perceptível quando se está com as pernas cansadas.
Vou clicando fotos aqui e ali, em busca de uma padaria onde possa saborear uma média (cuidado com esse termo, ele não significa a mesma coisa em todos os lugares do país) com pão de queijo.
E dali saio em busca de uma lan-house. Encontrei uma muito honesta, a Hangar, e aqui encontro-me quando os relógios marcam 18:30 hs. Já sei que fechará às 20:00, o que não será suficiente para eu concluir o que tenho de fazer (editar 4 videos, por exemplo).
Havia dito à Veralice que pernoitaria apenas uma noite nesta cidade, mas vou reconsiderar… não estou a fins de pedalar amanhã os 40 kms que me separam da próxima parada, Prudentópolis. Ainda estou amaciando… Destarte, creio que Imbituva poderá contar comigo por um dia a mais. Verei se acho algo para reportar, que não há muito o que se fazer aqui.
RESUMO CICLÍSTICO:
DATA: 29. Setembro. 2011 / Quinta-feira
LOCAL: Imbituva, Paraná (Brasil), ALTITUDE: 968m
TEMPO: Dia muito quente. Sem chuva.
TEMPERATURA: 35ºC no momento
KMs PEDALADOS HOJE: 67 km (Ponta Grossa a Imbituva)
MÉDIA: 10,5 km/h
VELOCIDADE MÁXIMA: 57 km/h
HORÁRIOS PARTIDA / CHEGADA: 08:30 hs / 15:15 hs
OCORRÊNCIAS: nada
TOPOGRAFIA: região montanhosa
CONDIÇÃO FÍSICA: Excelente.
DIAS DE ESTRADA: 27
DIAS PARADO (em reportagem, turismo ou descanso): 18
KMs PEDALADOS ACUMULADOS: 635 km
QUILOMETRAGEM TOTAL PERCORRIDA (inclui ar + mar): 635 km
Vai precisar de uma bicicleteira, já está tendo alucinações!!!
Pô, Luiz, a idéia até que não é má, hein? =)
Oiii Elcio… fica tranquilo, descansa mais um dia e aproveite para conhecer a cidade.
Já enviei email para Prudentópolis, mudando a data, amanhã falo com o Hotel e Prefeitura e te aviso!
Beijo e fica com Deus!
Grande Vera. Já aprendeu a voar com as novas asas? bjk
Estranho esse negócio de esquecer a possibilidade de encontrar uma camareira atraente porque, segundo suas próprias palavras, “deixou tudo para trás”…
Não esqueci nada não, Zé. Se bobear nóis pimba =) Abração
Mesmo com 1 dia a mais, as autoridades de Imbituva não se manifestaram. Uma cidade de 22 mil habitantes deve ter histórias interessantes…
Se sobrar tempo, após todas as edições de video que tenho prá fazer, vou sair na captura de algo, Elói.
É isso aí, imponha o seu ritmo, não dá pra ser de outro jeito, né não?!! Cuidado com as alucinações…bjk
Putz, Andréa… quanto a este tipo de alucinações, vai ficando a cada dia mais difícil. =) bjk
Senti que a cidade de Ponta Grossa te deixou “boas memórias”…rsrsrs
Foi mesmo. É engraçado… um lugar que nem me passava pela cabeça conhecer e de repente já me parece familiar, com bons amigos e boas lembranças. O bagulho é doido, Ronaldo. =) Abração
como vc está indo neste sentindo a proxima cidade é Prudentópolis, a cidade possui cachoeiras Gigantes, vale a pena conferir, também tem uns pratos tipicos ucranianos bem bom eu experimentei no Hotel Elite, ótimas pedaladas e abraços
Das cachoeiras já tinha ouvido falar, mas desse prato inda não. Boa dica, Osmin. Abração
A minha alucinação é suportar o dia a dia
E o meu delirio é a experiência com coisas reais.
Tem uma bicicleta aí?
Oi primo !!! Não sei porque mais dia de estrada pra mim é dia de preocupação ( talvez porque acho que voce fica mais exposto ),mas graças a Deus mais uma etapa vencida!!! Voce não ficou sabendo quem queria entrar em seu quarto???? kkkkk.Espero que sua estadia ai em Imbituva seja tão boa quanto em Ponta Grossa…Beijo boa noite e bom descanso.
Exposto ao sol, priminha… O sol de uma hora prá outra ficou brabo… Não fiquei sabendo quem era. Melhor assim, porque com certeza não era nenhuma Paola de Oliveira =) bjk
El Cio, isto saiu hoje no UOL, se não leu aqui vai:
O aventureiro canadense, Jean Béliveau, 56, vai completar a maior missão de sua vida no dia 16 de outubro: terá dado a volta ao mundo caminhando.
A caminhada já dura 11 anos e no próximo dia 16, ele deve chegar a Montreal, de onde partiu, com um total de 75.000 quilômetros percorridos. Para manter o ritmo, Béliveau caminha entre 30 e 40 quilômetros por dia.
Depois de já ter atravessado 64 países, ele já está de volta ao Canadá e chegará a Quebec nos próximos dias, iniciando assim a última etapa de sua longa caminhada a favor da paz. Antes, fará uma parada em Ottawa onde participará de diversas atividades.
Ao longo dos últimos anos, o canadense atravessou montanhas e desertos. Ele esteve no Brasil em 2003, no México ficou por nove dias, passou pelo Sudão, comeu insetos na África, viu animais exóticos na China e precisou ser escoltado por policiais nas Filipinas.
Durante os anos de caminhada, sempre acompanhado de seu carrinho – uma espécie de triciclo motorizado no qual levou mantimentos e itens pessoais – Béliveau nunca precisou de assistência médica. As únicas “roubadas” aconteceram no sul da África, onde foi roubado em uma cidade, e preso em outra, sem saber porque.
Béliveau partiu de Montreal com US$ 4 mil, valor que gastou em um ano. Assim que encerrar a caminhada e voltar para casa, seu próximo objetivo é escrever um livro contando sobre a experiência.
Tem louco prá tudo. Eu, hein? hehe Abração, Luis
Elcio, disso eu entendo um pouco, nas minhas viagens a trabalho,muitas vezes a solidão e a carencia entravam comigo no quarto. E eu tambem sonhava com uma mulher atraente batendo a minha porta.Mais a viagem não pode parar.
Abraço.
Ué, Jura… mas o que tem a ver uma coisa com a outra? Com mulher ou sem mulher não vai parar mesmo (ao menos não por enquanto). Abração
Adorei o relato de hoje. Mais ciclístico. Embora goste dos demais pois assim aprendo um pouco sobre os lugares que visita.
Primeiras semanas são difíceis. Daqui a pouco pedalar 100 km será como 100 m.
Depende do tempo, Clebson… com chuva fria congelando os ossos ou sol aberto derretendo o crânio fica difícil. E também da altimetria: 100 km no plano são muito diferentes de 100 km na cordilheira dos Andes… Mas aos poucos as pernas vão pegando o jeito. Porém senti que apenas 5 dias sem pedalar já fizeram diferença… abração
Oi Tio. to te acompanhando tá? Eu, o Gui e o Flávio. Pelo que vejo a aventura só está começando. bjão.
Fala, Preta. Beleza… vai botando um pouco de minhoca na cabeça do pimpolho, que ser normal o tempo todo acaba enchendo o saco = ) bjão Tio
Alguem falou, o sonho não para, outro disse, o show não pode parar e eu, a viagem não pode parar.
Entendeu ?
Ah… entendi. To viajando há 51 anos, Jura … hehe Isso só vai parar debaixo da terra.
Elcio,
Aproveite bem essa vida boa nos hotéis , no Atacama terá que montar a barraca em solo extremamente duro , conforto zero , já pedalei por lá ! Vc esta levando um martelinho de borracha ou coisa parecida ? Vai precisar para prender a barraca no piso duro do deserto .
Estou acompanhando sua viagem diariamente .
Um abraço
Alexandre
Vitória – ES
Alexandre, por sorte minha barraca – em último caso – nem precisa de estacas. Mas chegando mais perto veremos como fazer. Levava uma pá-picareta mas me desfiz dela por excesso de peso… Obrigado pela dica. Abração
Caro Elcio, primeiro parabéns pela aventura que escolheu, vc realizará o sonho de muitos acredito, que aqui o acompanham.
Um conselho, ou uma dica, se me permite, relativo ao filtro solar: compre fator 30, mais barato e praticamente tão eficaz quanto o 50, cientificamente provado. Ou uma dica melhor ainda, até para economia, invista em roupas com proteção solar, custam caro, mas duram bastante e acho que pra vc que vai viver na estrada um bom tempo vale muito a pena.
Olá, Denis. Até tenho uma camiseta branca anti-UV – presente da UV LIne – mas o meu maior problema são as coxas. Os braços bem ou mal seguram melhor a onda. Vou considerar a dica do FPS 30, porque a grana vai embora rapidinho e não tenho fonte de renda… Abração
Oi Elcio !!!
Nossa to aqui pensando nessas “novas asas” a que se refere? hahahaha
Prá você ser anja falta pouco, Vera
Parceiro; Roupas de protecão solar é a melhor pedida, o preco tbm queima mas,… agita esses seus patrocinadores aí, pô!! abraco
Pois é, Tony… a UV Line chegou a ficar tentada… mas não rolou. Ainda assim ganhei excelentes 3 camisetas anti-UV.
Camareiras !! Camareiras !! São deliciosas !! Será que você contou tudo ?? Gosto do item ” Condição fisica excelente ” Parabens !
Hehe… mas são problemáticas, Nésio. Cê viu o que aconteceu com o Dominique Strauss-Kanh? Tá certo que não sou candidato a nada, meu negócio é batucada… mas é bom tomar cuidado.
olá Elcio, tenho te acompanhado, embora com um grande atraso, mas faço questão de ler na cronologia correta, assim me sinto dia a dia contigo. neste post vi a foto de uma placa indicando Maringá o que me fez lembrar de um grande amigo que vive por lá, portanto esta mensagem além de ter o intuito de te agradecer pela oportunidade de viver esta aventura contigo, é tbm te perguntar se vc passará por lá e se tem idéia de quando, para que eu possa agitar algo pra vc junto deste amigo. no mais, grande bj e sorte nos pedais!
Fala, Sheilinha, blz? Compreendo perfeitamente, afinal ficar andando atrás de vagabundo não é tarefa para todo dia… hehe
Não vou passar por Maringá. Daqui me faltam somente mais duas paradas (Matelândia e Foz do Iguaçí) para sair do país.
Dê uma olhada no roteiro em http://www.rodaslivres.com.br/roteiro
Mas valeu a intenção
bjk
Eu